Tozé dos Perfume preocupado com o futuro da música [entrevista exclusiva]
Tozé Santos, vocalista da banda Os Perfume, analisou o momento atual da música portuguesa e mostrou-se preocupado com o futuro.
«A música precisa de entidades que ajudem a expor fidedignamente o que tem qualidade, ao invés de se promover tão exaustivamente o que está alicerçado com o poder económico.» A afirmação é de Tozé Santos, vocalista da banda Os Per7ume – Perfume – ao Portal de Notícias, à margem de um momento musical no encerramento do ano letivo no Colégio Júlio Dinis, no Porto. O músico tem marcado presença em escolas da zona Norte, para promover a música portuguesa junto das gerações mais jovens. Em entrevista exclusiva, fala da importância deste tipo de iniciativas e na «responsabilidade dos músicos» da sua geração para «encaminharem tudo no sentido mais assertivo».
Como analisa o panorama da música portuguesa atualmente?
De momento creio que a própria indústria, em toda a sua transversalidade, está perdida em relação ao rumo pode tomar. Desde que os artistas deixaram de necessitar de editoras para editar os seus trabalhos, tudo mudou. O panorama musical português só é sustentável com concertos, servindo os discos apenas e só de cartão de visita que justifiquem uma nova digressão. Acho que o panorama não é animador. A música precisa de entidades que ajudem a expor fidedignamente o que tem qualidade, ao invés de se promover tão exaustivamente o que está alicerçado com o poder económico. Cabe-nos a nós, músicos desta geração, encaminhar tudo no sentido mais assertivo.
De que forma pode reverter-se a situação?
É diante deste público, como este do Colégio Júlio Dinis, que temos de fazer uma espécie de marketing de guerrilha. Os jovens estão muito expostos a solicitações audiovisuais, vulgo YouTube, onde nem sempre lhes são dados a consumir os melhores conteúdos. É ótimo podermos mostrar-lhes que o pop nacional existe e está de boa saúde e que, se calhar, eles até podem identificar-se com este género que, infelizmente, não tem já tanto espaço nas ondas do FM. Não creio que a solução seja simples ou baseada num só fator que possa ser dissipado para que tudo volte a ser como era. Creio que a situação é mais crítica. Desde que a música passou a entrar no lar gratuitamente, muitas vezes ilicitamente, o mercado sofreu um revés e o principal implicado foi o artista. Produzir bem um disco continua a ter elevados custos e muito tempo de entrega, muitas das vezes não reconhecido. Acho que, primordialmente, se fosse exigível pagar-se para ter acesso à música, como é de resto com outros itens culturais (livros, filmes, etc). Tudo seria extraordinariamente diferente.
Gosta de levar a música aos mais novos?
Tenho feito redundantemente este tipo de ações e sempre que posso acedo a estes convites, ainda na passada sexta-feira fomos fazer um concerto de fecho de ano letivo na Maia e o que denoto é que muita gente desta geração não sabia sequer que existimos, por não sermos tão proeminentes nos canais da moda. Dá imenso trabalho? Sim. É gratificante…? Deveras!
As suas filhas ouvem que género de música? Tenta incutir-lhes o gosto pela boa música?
Eu tento fazer com as minhas filhas o mesmo que os meus pais e os meus irmãos fizeram comigo: mostrar de tudo, todos os géneros que existem, para possibilitar estímulos e, sobretudo, conhecimento exponencial. É perfeitamente natural que ouçam o que os amigos consomem, mas saberem igualmente o que os pais, tios e avós apreciam. Creio que, modéstia à parte, foi assim que me tornei audiófilo e conhecedor de muitas carreiras.
Depois de terem conhecimento de tudo, mais opções terão de poder escolher e optar. Muito sinceramente, estou grato por ver que não se limitam a um género ou a modas e tendências e que, comigo, partilham o gosto pelo culto de pegar num disco de vinil, tateá-lo e pô-lo a girar. (Risos)
Quais são as suas bandas de eleição?
Pois bem, também eu tive as minhas fases de eleger a melhor banda ou artista do mundo… comecei em 1985 a ter ícone sempre presente, o Bruce Springsteen. Logo no início dos anos 90 fui aficionado dos guitar-heros como Joe Satriani, Steve Vai, etc. Com a ascensão do som de Seattle, vulgo grunge em 1993/1994, veio a minha grande admiração pelos Pearl Jam que são, até à atualidade, uma grande referência. Fui para a Marinha em 1996 e estava apaixonado pelo disco dos Marillion da altura, que tinham trocado há pouco de vocalista. Estive no mês passado, curiosamente, a trabalhar com eles na Aula Magna, agora que somos grandes amigos! Mais ou menos pelo ano 2000 passei a interessar-me de latifúndio pelos Radiohead, nessa altura já muito experimentais. Importante referir que, de todos os tempos, o que mais admiro (e até ostento uma Tatoo) é o Mike Oldfield, com quem também já privei. Mas deixa-me referir que algumas bandas da minha predileção no momento não são propriamente conhecidas aqui pelo burgo, como os Eggstone, os Last Days pf April e/ou os Carpark North; mais uma prova que o que é efetivamente bom com qualidade não é necessariamente o que toca nas rádios…
Como está a correr a tour dos Perfume?
Estamos a mil, mas muito focados e, sobretudo, realizados. Se me dissessem há uns 20 anos atrás que ia estar a fazer o que faço e como faço, retorquiria que seria impossível. Hoje vivo um dia-a-dia absolutamente deslumbrado e grato por me ter sido proporcionado tamanho privilégio. A nossa tour arrancou há já duas semanas e vamos parar apenas e só quando acharmos que é altura de lançar o Eixo Z, aquele que será o álbum de viragem de muitos aspetos da banda. Até lá, eventualmente 2020, iremos lançar singles com campanhas sui-generis e cheias de surpresas.
Texto: Cynthia Valente | WiN Porto; Fotos: João Ribeiro
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