A infância de Lia Gama: «Era verdadeiramente agredida. Era com cinto, de toda a maneira e feitio
Lia Gama esteve este sábado no programa de Daniel Oliveira, na SIC, e recordou a infância marcada pela violência extrema por parte do pai e da madrasta.
O passado marcou de tal forma Maria Isilda que, de maneira a «diminuir» o sofrimento que viveu na infância, mudou até de nome quando se tornou independente, aos 14 anos. Lia Gama, assim é conhecida do público, sofreu de violência doméstica às mãos do pai e da madrasta dos 4 aos 13 anos. «Lembro-me de muito pouco, ou se calhar não me quero lembrar», conta. «Não tenho memórias gratificantes até ao princípio da adolescência».
«Se um dizia mata, o outro dizia esfola»
Numa entrevista emotiva a Daniel Oliveira, no programa Alta Definição, da SIC, Lia Gama, de 74 anos, conta que teve de ir viver com o progenitor e com a madrasta, porque a mãe não tinha condições, ficando apenas a tomar conta do irmão mais velho. Sobre a mãe, a artista recorda-a com alguma pena. «Coitada da minha mãe (…) foi uma mulher sofridíssima», relembra.
Da época em que vivia na companhia de ambos, a atriz tem poucas ou nenhumas memórias felizes. «O meu pai e a minha madrasta davam-se muito bem. Se um dizia mata, o outro dizia esfola. Às vezes levava duas vezes por coisas que nem tinha feito», recorda.
«Foi uma infância muito sozinha e solitária. Valia-me o teatro», paixão que ainda hoje toma conta da sua vida. «Ele (o pai) era mais violento que ela (a madrasta). Vivi sem afetos (…) Por isso é que eu sou como sou. Muito insegura, não parece mas sou. Digo tudo o que tenho a dizer, sou espontânea, libertei-me».
«O meu pai desesperava, batia-me e dizia: ‘chora’»
Quando questionada sobre se «acreditava no amor» do pai para com ela, a artista responde sem hesitar: «Nada!». «Admirava-lhe algumas coisas, a forma como ele se comportava, como ele saía para a rua (…) Tinha um ar digníssimo». Porém, sentia-se «um empecilho naquela relação».
«A minha madrasta dizia que gostava mais de rapazes e que tinha preferido ficar com o meu irmão. Eu era rebelde, nunca me acomodei e eles sabiam disso. Quanto mais me batiam menos eu chorava. Eu não chorava. O meu pai desesperava, batia-me e dizia: ‘chora’», conta visivelmente emocionada.
«Eu era tão agredida fisicamente que as vizinhas fizeram uma carta anónima para o tribunal de menores a queixarem-se daquela casa. Eles (pai e madrasta) foram julgados e absolvidos e eu fui interrogada várias vezes. Fizeram-me vários exames no instituto de medicina legal e eu nunca os denunciei. Ficou guardado para mim», diz.
«Lembro-me de uma vez levar uma sova monumental»
Agredida violentamente com regularidade, Lia Gama recorda um episódio que a marca até hoje. «Lembro-me de uma vez levar uma sova monumental. Era com cinto e com verdasca de marmeleiro, pediam-me para a ir buscar. Só me lembro da minha madrasta dizer ao meu pai ‘não lhe batas na cabeça’». «Eu não era uma criança submissa. Eu não me deixava subjugar, eu nunca tive vocação para vítima. Por isso em tribunal com os agentes da polícia de menores eu nunca dei o flanco a dizer sim».
O gosto pelos estudos e o facto de ser «muito inteligente», como se intitula, fizeram-na singrar na vida e, por isso mesmo, levam-na a afirmar que a «capacidade» de se «indignar» vai morrer consigo.
«Antes de morrer ele disse-me que realmente não tinha sido bom pai»
Assim que começou a representar, o pai ia vê-la ao teatro e foram várias as vezes que lhe pediu desculpa por todo o sofrimento que lhe causou. «Antes de morrer ele disse-me que realmente não tinha sido bom pai, Portanto, pediu-me desculpa. E eu disse-lhe, e é verdade, que ele podia ir em paz, porque se ele tivesse sido um bom pai eu não era aquilo que era, o que sou. Atriz por exemplo (…) Eu sou isto porque eu gosto e quero, por isso vá em paz», afiança. «As coisas nunca se esquecem, mas mesmo perdoar, eu não sei se tenho esse lado de saber perdoar. Quem me fez realmente mal eu não esqueço nem perdoo, mas o meu pai merece perdão, coitado dele».
A vida acabou por ser «generosa» com Lia Gama e, passados todos estes anos, a atriz confessa que encara a vida com um sorriso no rosto. «Eu gosto de viver. Acho que a vida foi muito generosa para mim, embora eu tenha feito um esforço dos diabos para chegar aqui de cabeça erguida (…) sou aquilo que sou porque tracei o meu caminho». «Sempre quis ter um filho, sempre quis provar aos outros o que é ser uma boa mãe e como se deve educar um filho», termina em lágrimas.
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