Ricardo Araújo Pereira acusado de bullying
Ricardo Aráujo Pereira fez uma referência ao ex-jornalista no “Isto É Gozar com Quem Trabalha”, da SIC. O antigo diretor de “A Capital” não gostou das críticas e, num longo desabafo publicado no Facebook, acusou o humorista de bullying.
Ricardo Araújo Pereira comparou Luís Osório – o antigo diretor de “A Capital” – a um cão quando recordou a entrevista que o antigo jornalista fez à ministra da Cultura e criticou-o:“Lambuzão com poder.” O ex-jornalista contra-atacou com um longo texto no Facebook.
Luís Osório foi alvo de sátira por parte Ricardo Aráujo Pereira durante uma emissão do programa “Isto É Gozar Com Quem Trabalha”, da SIC, à conta de uma entrevista feita à ministra da Cultura durante um podcast do PS. O humorista acusou o antigo jornalista de “lamber” as botas a Graça Fonseca quando mostrou a sua cadela em cima da mesa, a fazer o movimento com a língua aos sapatos. Num longo desabafo no Facebook, o ex-jornalista já reagiu e diz que Ricardo Araújo Pereira quis humilhá-lo por ter defendido que RAP não é o melhor humorista da sua geração.
Num momento inicial, Luís Osório acreditou que se tratava de uma brincadeira, mas depois viu que não. “Não era uma brincadeira. Ricardo montara a entrevista com bocadinhos que encaixou como se fosse um puzzle para criar a ideia que desejava. Uma mentira que fez passar por verdade” frisou. Ainda, confessou que nessa noite custou-lhe a adormecer por estar a pensar constantemente no motivo do ‘ataque’. Ponderou, até que considerou que poderia estar relacionado com um artigo que escreveu há quase um ano, publicado igualmente no Facebook, e no qual disse: “Ricardo Araújo Pereira não é o melhor humorista da sua geração.”
Leia abaixo o desabafo de Luís Osório.
POSTAL DO DIA
Ricardo Araújo Pereira
1.
A partir das dez da noite o meu telefone não parou de tocar.
Já viste?
Por favor, não vejas.
Um abraço, Luís.
Tive mensagens para todos os gostos.
De amigos íntimos, de amigos, até de quem gozou um bocadinho o prato.
Faz parte, Luís.
Não ligues.
Puseste-te a jeito.
2.
Vi com atenção os minutos que Ricardo Araújo Pereira me dedicou no seu programa na SIC.
Pensei que podia ser uma brincadeira à volta de como se manipula uma entrevista com alguém para que a entrevista pareça uma coisa que não foi. Corta-se aqui, corta-se ali, juntam-se pedaços que na entrevista vinham separados por muitos minutos, embrulha-se como se fosse a entrevista verdadeira.
Pensei que podia ser uma brincadeira para falar do “fake”, dos movimentos populistas que utilizam esse tipo de recursos que ele, muito bem, critica no Governo Sombra.
Mas não.
Não era uma brincadeira. Ricardo montara a entrevista com bocadinhos que encaixou como se fosse um puzzle para criar a ideia que desejava. Uma mentira que fez passar por verdade.
No entanto, deixei passar. São as regras do humor e tinha de estar à altura.
3.
Pensei que podia ser por alguma discussão que tivéssemos tido. Ou por alguma coisa mal resolvida num almoço há 10 anos. Mas não podia ser, nós não nos conhecemos pessoalmente, nunca nos cruzámos.
Então como explicar que Ricardo Araújo Pereira, num programa visto por mais de um milhão de portugueses escolhesse como alvo principal uma pessoa que é conhecida por uma minoria da sua audiência?
Continuei a fazer perguntas.
4.
Pensei que podia ser por estar a colaborar com o PS, mas isso não difere muito do Ricardo que assumidamente, e muito bem, colabora e é simpatizante do PCP.
Pensei que podia ser uma crítica por eu ser jornalista. Mas eu não sou jornalista, não tenho carteira profissional há nove anos.
Pensei que podia ser por ele achar que fui um fofinho na entrevista à ministra da Cultura, mas não podia ser porque ele é um fofinho em quase todas as entrevistas – viram a de Ana Catarina Mendes?
Pensei que podia ser por causa de um sketch que os Gato Fedorento fizeram há uns 15 anos. Lembro-me de um caixão onde estava um morto e um filho a esfregar as mãos por se estar a aproveitar da doença do pai para ser conhecido. O meu pai era o morto e eu o filho. Tínhamos acabado de publicar um livro e o meu pai achou piada ao sketch. Achou tanta piada que eu fiquei calado. Mas não podia ser porque era eu que devia estar zangado e não o Ricardo.
Não podia ser isso.
Pensei que podia ser por nunca me ter respondido a nenhuma mensagem nas várias que lhe deixei quando o convidei para ser entrevistado para o ciclo “30 Portugueses”. Mas não podia ser porque era eu que devia ficar chateado, não ele.
Pensei que podia ser para me ridicularizar, chatear, magoar com o seu sarcasmo e inteligência. Mas não, também não era isso. O sketch acabava com uma cadela, a bela Custódia, a fazer o que eu faço – a lamber os pés a quem passa. Não, ele queria fazer uma outra coisa. Desejava humilhar. Fazer bullying.
5.
Uma das pessoas que me telefonou foi o Miguel, um dos meus quatro filhos.
Tem 19 anos e estava indignado.
Pai, viste o que ele disse de ti?
Tens de o processar, pai.
Ri-me muito.
Comovi-me muito quando desligou.
Depois pensei que não iria pensar mais sobre o tema, mas enganei-me. Tive dificuldade em adormecer. E ao acordar continuei a pensar sobre o assunto.
6.
Então o que terá sido?
Pensei que tinha sido por causa de um texto que publiquei aqui no dia 17 de abril de 2020 – há cerca de dez meses.
Um postal que teve 500 partilhas e uma repercussão que paguei caro quase um ano depois.
Reproduzo o meu pecado original.
Porque penso mesmo que foi isto que o fez lançar-me uma fatwa.
LO
17/4/2020
POSTAL DO DIA
Ricardo Araújo Pereira não é o melhor humorista da sua geração
1.
Não quis escrever apressadamente sobre o “novo” programa do fundador dos Gato Fedorento. Depois não achei que valesse a pena a crítica, afinal existem outros assuntos mais importantes por estes dias do que dizer mal de um programa de televisão, Não irei desenvolver o que penso sobre “Isto é gozar com quem “trabalha” – é um programa igual ao programa que fez anteriormente num outro canal de televisão, mas menos surpreendente por já o termos visto antes.
Ricardo Araújo Pereira é um talento. Difícil duvidar disso. É culto e inteligente. Tem bom gosto. Mas infelizmente cristalizou no que resulta, no que os canais pagam, no que lhe dá dinheiro. Acontece aos melhores. Quando passam a ser milionários – e Ricardo e milionário tendo em conta os rendimentos no nosso país – passam a ter muito mais a perder do que a ganhar. Deixam como por milagre de ser incómodos. Ou a ser os tipos a quem se convida para que diga mal de uma forma que seja tolerável. Ou a pessoa que já não arrisca determinados assuntos com medo de perder audiências, contratos ou por outra coisa qualquer.
Ricardo pode desmentir tudo isto – e espero que o faça. Pode nos próximos anos provar que não é verdade o que alguns vão escrevendo. Voltar a inovar, voltar a inventar personagens. Voltar a surpreender. E deixar de ser tão previsível, a antítese da primeira fase da sua carreira.
Quando me sentei para ver os dois primeiros programas quis muito ser surpreendido. Quis muito gostar. Detesto o princípio, um bocadinho português, de ir para não gostar, de ir para depois criticar. Infelizmente não consegui.
2.
Só escrevi este “postal” para reparar uma injustiça. A injustiça de tantas vezes ouvir que Araújo Pereira é o melhor humorista da sua geração (quero retirar Herman José desta equação). A injustiça de um quase consenso à volta de uma ideia que, sendo subjetiva, por que de gosto, mereceria não ser consensual.
Porque o melhor humorista da sua geração é para mim, e sem discussão, Bruno Nogueira.
3.
Impossível compará-los por esta altura.
Bruno Nogueira arrisca em cada projeto. Arrisca nos formatos, nas plataformas, nas pessoas que convida, no texto, no contínuo evoluir de um personagem (a sua persona) que não é real, mas que também não é ficção. Uma figura paradoxal que parece atrair os opostos. Uma fragilidade (também física) que mistura com uma crua agressividade. Uma arrogância que mistura com generosidade. Uma vontade de ser livre que mistura com a melancolia de a poder perder na próxima curva.
Ouvir e ver Bruno Nogueira todas as noites no Instagram – num formato a que chamou “Como é que o Bicho Mexe?” é um exercício para ele, mas também para nós. Como se fossemos parte ativa dos seus sucessos e da sua hipótese de falhar, cúmplices de um artista de circo sempre próximo de cair na jaula dos leões ou de partir a espinha por não existir rede possível no lugar que nos propõe.
Onde Ricardo Araújo Pereira se defende, Bruno Nogueira arrisca. Onde RAP é conservador, Bruno é revolucionário ou, pelo menos, testa os limites de fazer humor, de comunicar num tempo confinado como este.
4.
Bruno Nogueira não é bem um humorista. Como aliás os maiores humoristas não o são. Quando víamos Buster Keaton ou Chaplin Chaplin víamos um abismo nos seus olhos. Quando vemos Ricky Gervais apercebemo-nos dessa mesma imensidão, uma espécie de tragédia a que estão condenados (apesar de todas as gargalhadas) os verdadeiros palhaços a quem ninguém salva quando cai a noite.
Bruno Nogueira irá falhar muitas vezes. Será o preço a pagar pelo seu não conformismo. Espero que não recue perante o abismo. Que confie num instinto que o leva a seguir em frente como se apenas existisse o presente.
LO
Texto: Carolina Sousa; Fotos: Redes Sociais
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