Cândido de Oliveira foi “personagem excecional” que dava para muitos filmes
O futebolista, treinador e jornalista antifascista Cândido de Oliveira foi “uma personagem excecional, absolutamente fantástica”, cuja vida dava para muitos filmes, disse o realizador Jorge Paixão da Costa em entrevista à agência Lusa.
Na quinta-feira chega aos cinemas o filme “Cândido, o espião que veio do futebol”, de Jorge Paixão da Costa, inspirada na vida de um homem cujo nome a maioria dos portugueses associa à Supertaça, que a cada época premeia o clube vencedor do confronto entre o campeão da Primeira Liga e o que superou ou atingiu a final da Taça de Portugal.
O realizador decidiu fazer esta longa-metragem, ficcional, mas biográfica, pouco depois de ter feito uma série documental para a RTP — “À porta da História”(2014) -, na qual abordava a vida de Cândido de Oliveira.
“Apercebi-me que era uma personagem excecional e que não dava um filme, dava seis filmes!”, exclamou Jorge Paixão da Costa.
Apesar de a vida do futebolista e treinador ter sido tão preenchida, o realizador, os argumentistas e a produtora Ukbar Filmes decidiram focar-se num dos períodos biográficos, no tempo em que Cândido de Oliveira se envolveu numa teia de espionagem com os ingleses, durante a Segunda Guerra Mundial, e foi preso e torturado pela PIDE, nos anos de 1940.
“Tinha a ver com a minha zona de conforto”, explicou Jorge Paixão da Costa, a propósito do período escolhido, porque já tinha abordado o mesmo período histórico nas recentes séries “O Atentado” e “A Espia”.
Além do mais, aquele “era o momento mais rico e interessante do Cândido”, admitiu.
Antifascista e crítico da ditadura de Oliveira Salazar, Cândido de Oliveira (1896-1958) trabalhava nos Correios e escrevia na imprensa desportiva quando se envolveu numa rede inglesa de espionagem, contra forças nazis alemãs, durante a Segunda Guerra Mundial, tendo participado na montagem de uma rede secreta de rádio-telegrafistas.
O desportista acabou descoberto, detido e espancado pela polícia política do Estado Novo, e enviado para o campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, onde esteve 18 meses, entre junho de 1942 e janeiro de 1944.
De regresso a Portugal, só seria “restituído” à “liberdade condicional” em maio de 1944, como se lê na ficha dos arquivos da PIDE.
Até essa altura, Cândido de Oliveira já tinha ficado conhecido por ter jogado no Benfica, por ter fundado o Clube Atlético Casa Pia, na instituição onde viveu depois de ficar órfão; já tinha sido selecionador nacional de futebol e trabalhado como jornalista na imprensa portuguesa.
Em 1945, já em liberdade e em Lisboa, Cândido de Oliveira cofundou o jornal A Bola, juntamente com António Ribeiro dos Reis e Vicente de Melo, e treinou o Sporting e o Futebol Clube do Porto.
Cândido de Oliveira morreria em 1958, em Estocolmo, em consequência de uma pneumonia, numa altura em que fazia a cobertura do Mundial de Futebol, na Suécia.
Só em 1974 seria publicado o livro que escreveu sobre o tempo em que esteve deportado e preso em Cabo Verde, intitulado “Tarrafal, o pântano da morte”.
Apesar de dar espaço à ficção para compor este ‘biopic’, Jorge Paixão da Costa tentou dar a conhecer “uma personagem absolutamente fantástica, do ponto de vista intelectual e psicológico”, que gostava muito de ópera e que era “um solitário despreocupado”.
“Era um homem rodeado de muita gente e ao mesmo tempo muito solitário”, disse.
O filme aflora ainda um tempo em que o futebol não tinha a importância nem a “cultura industrial” que tem hoje, mas foi um desporto que se tornou popular por mérito próprio e pela sociedade, opinou o realizador.
“A única coisa que um tipo praticamente podia escolher era o clube de futebol, e bater-se pelo seu clube de futebol quase como se fosse um partido político (…). Os portugueses não podiam escolher nada”, disse.
Em “Cândido, o espião que veio do futebol”, protagonizado pelo ator Tomás Alves, entram ainda Jorge Corrula, Teresa Tavares, Filipe Vargas, Carloto Cotta, David Medeiros, Tiago Aldeia e Margarida Moreira, entre outros.
O filme conta com 1,5 milhões de euros de orçamento e apoio financeiro do Instituto do Cinema e do Audiovisual, da RTP, da PIC Portugal, do Turismo de Portugal e da Câmara Municipal de Lisboa.
Jorge Paixão da Costa, 69 anos, é autor, entre outros, dos filmes “Adeus Princesa” (1990), “O mistério da estrada de Sintra” (2007), “Soldado Milhões” (2017), em correalização com Gonçalo Galvão Teles, e das séries “A Espia”, “Crónica dos Bons Malandros” e “Lúcia — A guardiã do segredo”.
Atualmente, Jorge Paixão da Costa está “a negociar um filme histórico maioritariamente francês” sobre o rei Carlos de Portugal, assassinado em 1908, e a rainha Amélia de Orleães, que morreu em 1951.
*** Sílvia Borges da Silva, da agência Lusa ***
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By Impala News / Lusa
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