Centro de Arquitetura do CCB reabre com novas perspetivas sobre coabitação entre espécies
O Centro de Arquitetura do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, que reabre na quarta-feira com uma “exposição polifónica” sobre a coabitação entre espécies, vai funcionar também como “espaço de encontro e de produção de conhecimento”, segundo a curadoria.

“É uma exposição polifónica porque tem muitas perspetivas. Queremos que seja uma narrativa coletiva e a várias vozes”, declarou a curadora-chefe Mariana Pestana, em entrevista à agência Lusa sobre a abertura do espaço encerrado há um ano.
O Centro de Arquitetura (CA) da Garagem Sul do Museu de Arte Contemporânea — Centro Cultural de Belém (MAC/CCB) reabre na quarta-feira, às 19:00, com entrada gratuita e uma programação que inclui uma conversa de apresentação da exposição “Interespécies” envolvendo vários investigadores, e música criada por sons de várias espécies.
O espaço vai funcionar “não apenas para acolher exposições que partam da arquitetura para falar sobre as grandes questões contemporâneas, mas também como lugar de encontro, de trabalho e de produção de saber”, sublinhou a responsável, formada na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto.
“O CA teve uma intervenção leve, mas bastante transformadora criada pelo ateliê BUREAU, respondendo a um programa curatorial que explora formas de criação de conhecimento coletivas feitas através de exposições, residências, bolsas de estudo, programas públicos e publicações”, descreveu a curadora-chefe à Lusa, acrescentando que o público poderá ali visitar projetos concluídos e outros em curso.
O espaço já funcionava como área expositiva da disciplina de arquitetura no CCB, e agora com o novo projeto liderado por Mariana Pestana, escolhida pelo CCB por concurso no início de 2024, terá também espaços de trabalho, para eventos e conversas.
No interior, o público vai encontrar o primeiro ciclo expositivo, dedicado ao tema da arquitetura interespécies, “que serve não só as pessoas, mas também os ecossistemas”.
“É uma abordagem ecológica da arquitetura, mais complexa”, explicou a arquiteta sobre um projeto que contou na equipa com Anna Bertmark, Fernanda Costa, Valentina Demarchi, Bernardo Gaeiras, Mathilde Gouin, Katerina Iglezaki, Carlos Pastor e Mariana Simões (Bauhaus of the Seas Research Group).
O projeto vem no seguimento do trabalho de investigação que Mariana Pestana tem desenvolvido, nomeadamente oficinas curatoriais com aquele grupo de investigadores com doutoramento em curso e investigação na área de arquitetura, design, interação e interespécies, “numa preocupação mais que humana”.
A exposição evoca os princípios das antigas exposições que misturavam curiosidades cientificas, projetos artísticos, elementos decorativos e materiais de decoração: “Essa convivência de diferentes formas de conhecimento influenciou bastante a nossa forma de trabalhar”, comentou.
“Interespécies” vai ser dividida em três partes: uma intitulada “Aproximar”, com projetos e exercícios de novas perspetivas de ver o mundo, que não a cartesiana; outra chamada “Coabitar”, com arquiteturas, materiais de construção que são de convivência de pessoas com peixes, insetos e mais diferentes espécies; e “Conspirar”, sobre a questão dos direitos da natureza e o modo como o urbanismo e a legislação têm evoluído no sentido de proteger determinadas espécies, para garantir a sua sobrevivência, avançou Mariana Pestana à Lusa.
Os visitantes serão surpreendidos pela descoberta de novas experiências, como a do designer que se propôs viver como um bode durante três dias, pastores que falam lingas que se aproximam dos sons dos pássaros para chamar o gado, ou a vida de um flamingo no estuário do Tejo.
A exposição envolve criadores das áreas do cinema, informática, biologia, videojogos, de forma a atrair um público mais amplo – além dos arquitetos — com curiosidade para experimentar, por exemplo, um jogo em que se troca de corpo com outras espécies, ou observar arquiteturas criadas especialmente para pássaros e insetos.
O projeto vê a arquitetura “como uma prática relacional, que põe em relação pessoas, lugares, condições laborais, vidas, territórios, materiais”, resumiu a investigadora.
“Consideramos que os usuários da arquitetura são pessoas mas também são pássaros, plantes e minerais”, explicou a curadora sobre uma linha de pesquisa que tem sido desenvolvida por alguns investigadores em todo o mundo.
Mariana Pestana coloca em primeiro lugar as pessoas, mas como parte de ecossistemas: “Nós vivemos em interdependência com outras espécies, como as árvores, e é importante ter isso em conta. É uma consciência para melhorar a qualidade de vida dos seres humanos”.
“É também uma posição filosófica pós humanista, a partir de dentro da natureza, e realmente um pouco crítica da forma de fazer arquitetura industrializada, virada para buscar outras referências”, sustentou cofundadora de The Decorators, um estúdio interdisciplinar que concebe objetos, ‘workshops’, eventos e edifícios através de processos colaborativos que investigam noções de lugar, comunidade e comensalidade.
Para as residências, que passarão a ser anuais no Centro de Arquitetura, foram selecionados, este ano, o ateliê dinamarquês Superflex em conjunto com os portugueses KWY e o Estúdio Obsidiana, que desenvolvem projetos de arquitetura para pessoas e pássaros.
Os ateliês em residência irão criar instalações de arquitetura para apresentar no Jardim das Oliveiras e no Jardim da Água do CCB a inaugurar em 28 de junho, com um programa paralelo de conversas, indicou.
O que também terá continuidade a partir deste ano são as duas bolsas anuais de arquitetura para todas as pessoas ou coletivos, no valor de 10 mil euros cada, e que correspondem à temática de cada ano do Centro de Arquitetura do CCB.
A curadora sublinha a importância destas bolsas num país onde existem poucos apoios para a criação em arquitetura: “É importante acrescentar um valor que permita dar um primeiro passo, fazer um projeto e promover manifestações de arquiteturas com um caráter mais de investigação ou experimentação que não sejam necessariamente obra construída”.
Questionada sobre os públicos que quer atrair à Garagem Sul, a responsável disse que os visitantes deste espaço “são muito fiéis” e espera que seja interessante para os arquitetos que estão a estudar, poder encontrar ali resposta a algumas das suas preocupações.
“Do contacto que tenho com alunos, vejo que têm muitas preocupações de ecologia, muito centrais nesta geração, e também face ao clima politico atual internacional muito desolador. Aqui queremos, através da arquitetura, investigar formas de existir, de pensar de estar no mundo que permitam alguns espaços de segurança e de esperança”, disse.
O Centro de Arquitetura do MAC/CCB vai estar aberto ao público a partir de quinta-feira, entre as 10:00 e as 18:30, iniciando um novo ciclo com o foco na coabitação entre humanos e outras espécies.
AG // MAG
By Impala News / Lusa
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