Hospital Santa Marta realiza 300.º transplante pulmonar em 20 anos
Duas décadas após a realização do primeiro transplante pulmonar, o Hospital Santa Marta, em Lisboa, realizou agora o 300.º, considerado “uma enorme marca de sucesso” pelo cirurgião responsável do serviço do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC).

“Estes 300 transplantes representam uma enorme marca de sucesso de uma coisa que, neste momento, já não é um ‘sprint’, mas é uma corrida de fundo e representam o trabalho de anos e de gerações de pessoas”, diz o cirurgião cardiotorácico José Fragata, responsável pelo Centro de Referência de Transplante Pulmonar, único no país. Dos recentes transplantes pulmonares realizados, o 298.º fica na história por ser o primeiro transplante realizado a um doente vítima da covid-19 em Portugal.
“É um senhor de 60 anos, que tinha um perfeito estado de saúde, mas que adoeceu com covid. Esteve ventilado meses, o que também estraga os pulmões, e depois foi colocado em ECMO”, dispositivo de circulação extracorporal que permite substituir temporariamente a função de coração e pulmões. Para José Fragata, este caso representa a articulação que existe entre unidades do Serviço Nacional de Saúde, que, afirma, “só pode ser de elogiar”.
“O Hospital Santa Maria tratou e preservou este doente de uma forma absolutamente impecável ao ponto de estar em condições para ser transplantado”, enaltece. Para o cirurgião, “foi uma coisa bonita de se ter vivido” e fez-se história. “Foi a primeira vez – e calculo que não seja a última neste país – que se transplanta por causa desta pandemia”, situação que considera “preocupante”.
Transplante pulmonar em doentes covid-19
“Estamos perante uma realidade emergente, cuja dimensão total desconhecemos. O que sabemos é que a covid-19, na sua forma mais expressiva de gravidade, deixa sequelas, defeitos residuais no pulmão”, mas não se sabe se são ou não evolutivos porque passou “muito pouco tempo”. José Fragata exemplifica que a gripe H1N1 pode fazer isso excecionalmente, mas na covid não é assim tão raro. “Em janeiro, estavam descritos no mundo 15 transplantes como consequência de lesões pulmonares da covid”, número que o especialista estima já poder ter duplicado.
O diretor do Departamento Coração, Vasos e Tórax do CHULC avança que está a seguir-se “com muita atenção” alguns doentes que estiveram ventilados muito tempo devido à covid-19, para ver se o pulmão recupera. Caso a situação evolua para fibrose pulmonar, como foi o caso do doente de Santa Maria, poderão ter necessidade de transplante.
O primeiro transplante no Hospital Santa Marta foi realizado em 2001 pelo médico Henrique Vaz Velho. “Entre 2001 e 2006, a atividade foi muito errática, fazia-se um caso ou dois por ano. Foi uma atividade verdadeiramente pioneira” e “uma luta muito sofrida, mas muito saborosa, porque a ganhámos para o País”, salienta José Fragata, que assumiu a direção do serviço em novembro de 2006.
“A partir de 2007, tinha verdadeiramente nos ombros a responsabilidade de dinamizar o programa. Tivemos um crescimento sempre sustentado e começámos a fazer quatro transplantes num ano, oito noutro, 16 noutro”, recorda. O crescimento foi exponencial e o “melhor ano” foi 2019, em que foram feitos 39 transplantes. “No ano da pandemia, fizemos 33. Agora estamos praticamente com 20 e acho que neste ano vamos ultrapassar facilmente os 40”, destaca.
Estes números colocam Portugal “no quartil dos centros que mais transplantam no Mundo”, porque, habitualmente, a média é 10 casos por ano. “A transplantação pulmonar é uma história que o Serviço Nacional de Saúde pode contar, porque em 2007 todos os doentes iam para Corunha, Madrid ou Paris e, neste momento, não vai nenhum doente para fora, porque não é necessário porque temos resultados auditados e auditáveis que igualam, superando, os resultados da Sociedade Internacional de Transplantação”, vinca. Portanto, sustenta, é um programa não só com volume alto”, mas com “boa qualidade clínica”.
“Posso sair descansado do hospital porque este programa está pegado e isso também é obrigação de quem o liderou, que é deixar assegurada a continuidade”, diz, rematando que Portugal está “genuinamente bem” em termos de transplantação pulmonar.
Siga a Impala no Instagram