Nova edição de álbum “Gostava de Ser Quem Era” de Amália inclui 14 inéditos
Uma nova edição, em disco duplo, do álbum “Gostava de Ser Quem Era”, de Amália Rodrigues, inclui 14 inéditos e gravações de atuações ao vivo em 1980.
A nova edição surge no âmbito do projeto da integral de gravações da fadista, levado a cabo pelo investigador Frederico Santiago desde 2014.
O álbum “Gostava de Ser Quem Era” foi publicado originalmente em 1980 e é o primeiro totalmente preenchido por poemas de Amália Rodrigues (1920-1999), que já tinha assinado “Estranha Forma de Vida” décadas antes.
Em declarações à agência Lusa, Frederico Santiago realçou o “som inédito” desta nova edição, “sem um eco característico das edições na década de 1980”.
“Há o próprio som que é inédito, porque o disco na altura, e a 1.ª edição em CD, foi feito com aquele eco muito de época – que se usava na década de 1980 -, mas as bobinas originais não o têm, estão com o som puro e muito mais intimista. Esse eco era um bocado para disfarçar a voz da Amália, que tinha 60 anos, e já não tinha a voz clara e brilhantes das décadas anteriores, mas tiravam-lhe muito detalhe e sobretudo a dicção”, disse.
“Todas as pessoas pensam que Amália [no fim de carreira] não se percebia, e eu acho que isso era muito causado pelo eco excessivo que se usava nas gravações, porque quando ouvimos o som puro, percebemos que a dicção é perfeita, e não há esse problema, um som que se ouvia não só na voz como nas guitarras”, afirmou.
Frederico Santiago exemplificou com o fado “Tive um Coração e Perdi-o” (A. Rodrigues/José Fontes Rocha), em que esse som de eco nas edições anteriores “fazia desaparecer uma coisa que é muito evidente agora, Amália foi só acompanhada por uma guitarra, trata-se de um dueto entre Amália e o [guitarrista] José Fontes Rocha, que é impressionante”.
Entre os inéditos, há os poemas de Amália “Viver é estar-se Perdido”, “Menina da Saia Verde”, “Postigo”, “O Carapau e a Sardinha”, “Cabra, Cabrita” e “Saia Amarela”.
Contam-se ainda, de Mário Martins, “Uma Réstia de Sal”, de Belo Marques, “Tareco Tenho” e “Dona Pata”, de António Jorge Fontes, “Escadinhas de Alfama”, e, de João Cutileiro, “Habito o meu País”, além das atuações ao vivo, em 1980, em Lisboa.
Estas atuações surgem depois de problemas cardíacos sentidos pela fadista, em 1979, no final de uma atuação no Casino Estoril, que fizeram com que fosse hospitalizada e cancelasse vários espetáculos.
Neste período de convalescença, Amália dedicou-se a reunir os seus poemas e a gravar o álbum “Gostava de Ser Quem Era”.
Frederico Santiago recorda que Amália se referiu a este período como “uma espécie de terapia”.
O fado “Lava no Rio Lavava”, um poema de Amália com música de Fontes Rocha, abre o álbum “Gostava de Ser Quem Era”, mas Amália chegou a ensaiá-lo na melodia do Fado Cravo, de Alfredo Marceneiro, revelou Santiago.
“Estes poemas de Amália, ‘estes versos’, como ela dizia, são muito simples, mas são profundos. ‘Lavava no Rio, Lavava’, por exemplo, é profundíssimo, sobre essa incapacidade de ter vontade, porque ela diz que, quando era nova e tinha falta de coisas, tinha muito mais vontade do que naquela altura”, afirmou Frederico Santiago, que qualificou este disco como “muito especial”.
Para o investigador, foi “um momento muito denso e profundo na vida de Amália que tem a carreira que tem, e ainda a tem nesta altura, um bocado triste pelo que se passou no Período Revolucionário em Curso [PREC] e todas as invejas que a tentavam ligar a um regime do qual ela só foi contemporânea, ela não tinha qualquer ligação, e só se aproveitou dela”.
“A partir de 1975, muitas pessoas tentaram alcançar o lugar que ela tinha, que era de tal maneira cimeiro que muitas pessoas não lhe perdoavam. […] Teve alguns dissabores, mas foi conquistando sempre o público, ela teve essa vontade de estar perante o público e provar que era apenas uma artista e tinha aquela dádiva toda e apenas isso”, disse o investigador.
“Do público nunca houve essa traição, mas em termos oficiais tentaram apagá-la um bocadinho”, disse o investigador que se referiu a “um período muito triste da vida de Amália”.
À Lusa, Santiago afirmou que há ainda muitas gravações de Amália para trazer à luz do dia: “Ela sempre que gravava em estúdio, fazia muitas sessões, e os discos levavam 10 ou 12 temas e depois as coisas ficavam por lá”.
Nesta edição, um CD é dedicado aos ensaios de 11 temas, incluindo “Senhor Extraterrestre” (Carlos Paião), gravado em dezembro de 1979.
Este CD inclui duas atuações, ambas em 1980, uma no demolido Teatro Monumental, em Lisboa, a 28 de janeiro, e outra na festa de homenagem ao realizador de rádio José Castelo, no Coliseu dos Recreios, a 02 de fevereiro.
Amália Rodrigues estreou-se aos 18 anos no Retiro da Severa, em Lisboa, tendo protagonizado uma carreira de mais de 50 anos que a levou aos mais prestigiados palcos do mundo, do Casino de Copacabana ao Olympia, em Paris.
Amália cantou os seus poemas, mas também os de Luis de Camões, David Mourão-Ferreira, Alexandre O’Neil ou Pedro Homem de Mello, entre muitos outros.
NL // TDI
By Impala News / Lusa
Siga a Impala no Instagram