O que há de tão especial nos minerais da Ucrânia?

Por que são tão importantes e procurados os minerais da Ucrânia – centrais para a geopolítica global, com o presidente dos EUA, Donald Trump, a procurar um acordo com Volodymyr Zelensky, para ‘deitar-lhes a mão’?

O que há de tão especial nos minerais da Ucrânia?

Os minerais da Ucrânia tornaram-se centrais para a geopolítica global, com o presidente dos EUA, Donald Trump, a tentar um acordo com Volodymyr Zelensky, para aceder-lhes. Que minerais são estes, exatamente, e por que são tão desejados?

A Ucrânia é frequentemente reconhecida pelas suas vastas terras agrícolas e património industrial, mas por baixo da superfície encontra-se uma das formações geológicas mais notáveis ​​do mundo, o ‘Escudo Ucraniano’. “Esta rocha cristalina maciça e exposta, formada há mais de 2,5 mil milhões de anos, estende-se por grande parte do território ucraniano e representa um dos blocos continentais mais antigos e estáveis ​​da Terra”, expõe Munira Raji, geóloga da Universidade de Plymouth. A formação passou por “múltiplos episódios de construção de montanhas, formação e movimento de magma e outras alterações”.

Estes processos criaram condições geológicas “favoráveis ​​para a formação de vários depósitos de minerais, incluindo lítio, grafite, manganês, titânio e outros elementos de ‘terras raras‘ – todos subitamente críticos para as indústrias modernas e para a transição global para a energia verde”. A Ucrânia tem depósitos de “22 dos 34 minerais críticos” identificados pela União Europeia como essenciais para a segurança energética – fator que “posiciona a Ucrânia entre as nações mais ricas do mundo em recursos” desta natureza.

À medida que o mundo corre para a descarbonização, a procura por minerais críticos disparou. Veículos elétricos, turbinas eólicas, painéis solares e sistemas de armazenamento de energia exigem lítio, cobalto e elementos de terras raras que abundam na Ucrânia. O preço do lítio subiu de 1.500 dólares (1.373,33 euros) por tonelada, na década de 1990, para cerca de 20.000 por tonelada nos últimos anos (18.311 mil euros). Apesar da extraordinária valorização, “espera-se que a procura aumente quase, pelo menos, 40 vezes, até 2040”.

De acordo com a Agência Internacional de Energia, o número de veículos elétricos deve ultrapassar “125 milhões até 2030”. Calcula-se ainda um crescimento semelhante para outros metais de essenciais para baterias. Cada veículo elétrico requer significativamente “mais lítio do que componentes eletrónicos convencionais”. Por exemplo, “uma bateria do Tesla Model S requer aproximadamente 63 quilos de lítio de alta pureza”.

A Ucrânia tem três grandes depósitos de lítio, que incluem Shevchenkivske, na região de Donetsk, e Polokhivske e Stankuvatske, na região central de Kirovograd – “todos no interior do Escudo Ucraniano”. Apesar do potencial mineral significativo, muitos dos depósitos minerais da Ucrânia permanecem “amplamente inexplorados devido à guerra” imposta pela Rússia, que interrompeu as operações de mineração e danificou as suas infraestruturas.

O depósito de lítio de Shevchenkivske contém altas concentrações de espoduménio – principal mineral portador de lítio usado na produção de baterias. A reserva ucraniana de Shevchenkivske é estimada em 13,8 milhões de toneladas de minérios de lítio. Extraí-lo requer um “investimento estimado de dez a 20 milhões de dólares” (9,16 a 18,31 milhões de dólares) antes de a mineração propriamente dita poder começar. O depósito de Polokhivske, com aproximadamente 270 mil toneladas de lítio, é considerado “um dos melhores locais de lítio da Europa” – motivado pelas condições geológicas favoráveis, tornando a “extração economicamente mais viável”.

O lítio, no entanto, “representa apenas um dos elementos dos recursos minerais da Ucrânia”. De acordo com um estudo geológico dos EUA, a Ucrânia está classificada globalmente como a terceira maior produtora de rutilo – equivalente 15,7% da produção total mundial. É a sexta maior produtora de minério de ferro (3,2% da produção total) e de titânio (5,8%), bem como a sétima maior produtora de manganês (3,1%). Tem também as maiores reservas de urânio da Europa, “cruciais para energia nuclear e armamento”. Ostenta depósitos significativos de elementos de terras raras, incluindo “neodímio e disprósio, necessários para fabricar desde smartphones a turbinas eólicas e motores elétricos”.

Além disso, a Ucrânia “abriga comprovadamente as maiores reservas de minérios de manganês do mundo”. Existem aproximadamente “2,4 mil milhões de toneladas concentradas, principalmente na Bacia de Nikopol, na encosta sul do Escudo Ucraniano”. A importância estratégica dos minerais da Ucrânia “ganhou reconhecimento na diplomacia internacional”. Negociações bilaterais recentes entre Ucrânia e EUA destacam a importância geopolítica destes recursos.

O acordo dos minerais proposto “obriga a Ucrânia a contribuir com 50% dos futuros lucros de recursos minerais estatais, petróleo, gás e outros materiais extraíveis para um fundo de investimento de reconstrução no pós-guerra”. O fundo seria administrado em conjunto por Kiev e Washington. O interesse dos EUA nos minerais ucranianos “reflete uma preocupação geopolítica mais ampla sobre aumento da procura, movimentos voláteis de preços e vulnerabilidades da cadeia de abastecimento”.

Embora os EUA tenham “muitos destes minerais essenciais” existentes na Ucrânia, os norte-americanos reduziram drasticamente a mineração e a refinação “devido a regulamentações ambientais, altos custos de mão-de-obra e mercados estrangeiros mais atraentes”. Esta política levou à “dependência de importações, particularmente da China”, que “domina produção e processamento” de minerais críticos. ‘Deitar a mão’ aos minerais da Ucrânia em troca de proteção militar significa que “os EUA podem evitar ter de comprá-los à China”.

A estratégia federal dos EUA afirma, de facto, que “dará prioridade à diversificação através de parcerias de segurança mineral com o objetivo de estabelecer uma cadeia de abastecimento mais estável e resiliente”. Os minerais essenciais dos EUA estão distribuídos por várias províncias geológicas, incluindo os Montes Apalaches, o Cinturão Cordilheiro e o Escudo Pré-Cambriano, expostos em partes do centro-oeste.

Embora os EUA tenham desenvolvido recursos substanciais de lítio, particularmente em Clayton Valley, no Nevada, e na Kings Mountain, na Carolina do Norte, “grande parte da produção atual de lítio vem de operações de salmoura – extração de soluções salinas, como água do mar ou lagos salgados, que podem ser mais caras do que a mineração de rocha dura”.

A alteração global em direção à energia verde e ao transporte elétrico “está a acelerar e os minerais estão no centro desta transição”, diagnostica Raji. Cerca de 80% do lítio produzido globalmente é usado na produção de baterias. As grandes empresas “estão a investir milhares de milhões na produção de veículos elétricos, gerando uma procura sem precedentes pelos minerais que alimentam esta tecnologia”.

A riqueza mineral da Ucrânia “posiciona-a, de facto, como líder potencial na revolução da energia limpa”. Quando a estabilidade regressar, a Ucrânia terá “uma oportunidade de ouro para remodelar a cadeia de abastecimento global de minerais críticos”. Mesmo colocando metade nas mãos dos EUA, “continuaria a ser capaz de financiar as infraestruturas domésticas, o crescimento industrial, os empregos e a recuperação económica”, considera Munira Raji, geóloga da Universidade de Plymouth.

Foto: Tom Fisk

The Conversation

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