Portos nacionais como porta de entrada de contrabando na mira da Procuradoria Europeia
Os portos de Leixões e Sines, mas também as fronteiras aeroportuárias nacionais, são uma preocupação crescente para a Procuradoria Europeia em relação a crimes de contrabando, agravada pelo cenário provável de guerra comercial a envolver a União Europeia.
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Portugal tem oito investigações ativas na Procuradoria Europeia (EPPO, sigla em inglês) que dizem respeito a crimes aduaneiros, ou seja, crimes de contrabando, adiantou à Lusa o procurador europeu português, José Ranito, a propósito da divulgação do relatório anual de atividades de 2024 deste organismo judicial da União Europeia (UE).
“Antevê-se uma guerra comercial, portanto isto envolve uma atuação vigilante da UE relativamente a produtos que vêm de fora. (…) É uma preocupação que temos relativamente a Leixões e Sines, mas também nas fronteiras aeroportuárias. Temos identificados crimes nesta área em que Portugal está a servir de porta de entrada para outros países”, disse José Ranito.
A tentativa de mascarar a proveniência de produtos com origem na China, taxados “mais gravosamente” pela UE para proteção do mercado interno de práticas de ‘dumping’ (vender abaixo do preço de custo), são um dos motivos na base dos crimes aduaneiros, mas a EPPO, a nível geral, tem também sinalizado a tentativa de através deste tipo de crime contornar sanções impostas à Rússia pela invasão da Ucrânia.
José Ranito manifestou a preocupação do agravamento dos crimes aduaneiros “num cenário internacional em que há a afirmação comercial de vários blocos geopolíticos, em que a Europa está no meio”.
Sobre as 44 novas investigações abertas em 2024 na representação nacional da EPPO, José Ranito admite “um aumento tendencial das investigações que poderão dizer respeito a crimes relacionados com fundos europeus”, que deverá também agravar-se face ao período de coexistência de vários programas de fundos comunitários em execução.
Os programas de recuperação e resiliência (PRR) dos vários Estados-membros são um alvo crescente de denúncias e investigações ativas, um cenário a que Portugal não escapa, com oito investigações em curso atualmente, mas o procurador europeu português não quis comentar o eventual impacto das medidas recentemente adotadas no país para facilitar procedimentos e acelerar a execução das medidas previstas.
“Uma das características do PRR é a necessidade de execução num curto espaço de tempo. Relativamente aos sistemas de controlo não opinamos, porque não fazemos parte da arquitetura da montagem do sistema nem fomos convocados para fazer análise ao perfil de risco da corrupção, é algo que deferimos para as entidades nacionais que têm esse mandato”, disse.
Sobre a fraude ao IVA, que permanece, em Portugal e em todo o espaço de atuação da EPPO, como o tipo de crime que mais prejuízo causa aos interesses financeiros da UE, José Ranito adiantou que a Comissão Europeia está a preparar alterações legislativas relativas ao “modo de monitorização das transações intracomunitárias” com o objetivo de “antecipar a deteção e impedir este tipo de crimes”.
O IVA intracomunitário está a ser usado por crime organizado que antes se dedicava a outras áreas, apontou o procurador José Ranito, explicando que isso se deve também à “própria arquitetura do IVA no espaço da UE”, que permite lesar os cofres dos Estados “e, reflexamente, os cofres comunitários”, uma vez que parte deste imposto entra diretamente para o orçamento da UE.
“O que estamos a ver é crime planeado, crime organizado, disperso por várias jurisdições, com apoio legal, apoio contabilístico, utilização do sistema financeiro e isto é algo que nos preocupa”, disse o procurador europeu.
José Ranito destacou a “tripla dimensão” do impacto deste crime — prejuízo financeiro direto, a violação do princípio de igualdade de oportunidades para operadores económicos e a segurança interna, um dos sinais de alarme lançados pelo relatório de 2024 da EPPO e que o procurador português associa também aos crimes de contrabando.
“Até à existência da EPPO as autoridades nacionais tinham uma visão muito umbilical dos impostos que eram devidos em cada um dos Estados. Acabámos por tentar aplicar uma visão diferente, o que nos interessa é o espaço da UE como um todo e não apenas o dano em IVA em Portugal. Creio que esta é evidentemente uma mais-valia da nossa atuação em crime transfronteiriço. É por isso que também nos mostramos disponíveis para ter um papel a dizer na violação das sanções impostas à Rússia”, disse.
A EPPO tem atualmente 24 Estados-membros, com a adesão em 2024 da Polónia e da Suécia.
O organismo, que funciona como um Ministério Público independente e altamente especializado, entrou em atividade a 01 de junho de 2021 e tem competência para investigar, instaurar ações penais, deduzir acusação e sustentá-la na instrução e no julgamento contra os autores das infrações penais lesivas dos interesses financeiros da União (por exemplo, fraude, corrupção ou fraude transfronteiriça ao IVA superior a 10 milhões de euros).
IMA // JMR
By Impala News / Lusa
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