Voz das mulheres jovens ouve-se nos protestos e está a ser reconhecida na Coreia do Sul

As mulheres jovens sul-coreanas votam mais à esquerda e estão a emergir como líderes de opinião, incluindo nos últimos dias, quando saíram em força para as ruas a exigir a destituição do Presidente conservador

Voz das mulheres jovens ouve-se nos protestos e está a ser reconhecida na Coreia do Sul

Nos protestos, à frente da Assembleia Nacional, ouviam-se sobretudo mulheres a gritar, recorda Jung Hyun-joo. E enquanto ali estava, a professora da Universidade Nacional de Seul não conseguia deixar de pensar em como a voz feminina ocupa um papel cada vez mais central na contestação.

Esta presença, reflete em entrevista à Lusa, é um fenómeno recente. Mulheres “na casa dos 20 e 30 anos emergiram como um grupo importante de líderes de opinião em todos os aspetos da vida social, incluindo, mas não se limitando, a questões políticas”, disse.

“Nas últimas presidenciais, ficou claro que as mulheres jovens deram um apoio esmagador ao partido progressista [Partido Democrático], em contraste com os pares masculinos, que emergiram como um novo grupo conservador”, exemplifica.

Nessas eleições, em 2022, 58,7% dos homens com idades entre os 18 e os 29 anos escolheram Yoon Suk-yeol, atual Presidente, ficando apenas atrás da faixa etária mais velha (mais de 60 anos).

Já as mulheres com menos de 30 anos foi quem menos apoiou o líder conservador entre todos os grupos analisados – apenas 34%, indicam sondagens à boca das urnas.

Kim, de 22 anos, e Na, de 21, são estudantes da área das Humanidades da Universidade de Dankooku, fora de Seul, e têm participado nos protestos.

“Há aqui tantas mulheres porque os homens apoiam o Partido do Poder Popular [PPP]”, diz Kim. “O PPP tem sido durante muito tempo o partido dos mais fortes [homens] e parece que as mulheres, a minoria, levantam mais a voz”, diz Na, que também prefere não ser identificada pelo nome completo.

Na madrugada que antecedeu a votação da moção de destituição de Yoon Suk-yeol – que impôs há uma semana a lei marcial, suspendendo-a poucas horas mais tarde – um grupo de pessoas ficou a guardar os portões da Assembleia Nacional. Estes vigilantes noturnos, conta Chan Mi, outra manifestante, eram sobretudo jovens mulheres.

“As mulheres coreanas, seja qual for a idade, sempre participaram durante crises nacionais nos protestos tanto quanto os homens – e agora mais do que os homens, penso. Mas os ‘media’ sempre as sub-representaram e a história não lhes deu justo crédito”, analisa.

Mas a especialista Jung Hyun-joo, ligada aos estudos de género, considera que houve um momento recente que levou ao “despertar político” das mulheres mais novas: um femicídio, em 2016, numa casa banho pública de um bar de karaoke em Seul. Kim Seong-min, um homem de 34 anos, esfaqueou até à morte uma mulher que não conhecia.

As adolescentes, grupo mais afetado pelo evento “são agora jovens adultas”, nota Jung.

“Estimuladas pelo rápido desenvolvimento da Coreia e com um elevado nível de formação, mas confrontadas com antigas tradições patriarcais que ainda existem em muitos setores da sociedade coreana, as jovens mulheres na casa dos 20 e 30 anos têm uma energia e uma sensibilidade política diferente das gerações mais velhas e dos pares masculinos”, contextualiza.

Outro episódio ocasionou este afastamento político entre homens e mulheres mais novos, sugere Kim Hun-joon, cientista político da Universidade da Coreia. Como parte da estratégia da campanha, em 2022, Yoon anunciou, “um dia, do nada”, a intenção de abolir o Ministério da Igualdade de Género e Família.

“Foi uma estratégia polarizadora, ele queria o apoio dos jovens homens eleitores e então tornou isto num assunto fundamental”, recorda.

A luta antifeminista tem vindo a conquistar espaço com o atual Presidente. Kim, investigador na área dos Direitos Humanos, considera que os jovens conservadores sentem que “têm tido um tratamento social e noutras áreas desigual em relação às mulheres”.

Rhee Jane, de 22 anos, ativa nos recentes protestos, defende que as mulheres mais novas são quem mais tem saído à rua. Antes “não lhes prestavam muita atenção”, mas neste movimento pró-destituição, “têm sido reconhecidas, as pessoas estão a ouvi-las”, diz a estudante de Antropologia.

Já Chan Mi lembra outros tempos para explicar a mobilização feminina. “Sabemos que as mulheres, especialmente as jovens, são sempre o grupo mais vulnerável quando o país se torna instável. Tendo em conta a história da Coreia, as mulheres são as primeiras a serem despedidas quando há um abalo na economia”, refere.

A jovem de 30 anos diz ainda que a população feminina é também o “primeiro alvo do crime quando a segurança é ameaçada”

“A liberdade das mulheres é a primeira a ser oprimida em tempo de ditadura. É por isso que as mulheres agem”, sublinha.

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By Impala News / Lusa

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